Esquizofrenia
A esquizofrenia às vezes é considerada como a mais devastadora das doenças mentais, porque seu início ocorre cedo na vida do paciente, e seus sintomas podem ser destrutivos para o paciente, para sua família e amigos. Embora distúrbios psicóticos severos sejam reconhecidos há séculos, a classificação desses distúrbios, especificamente como doença maníaco-depressiva ou esquizofrenia, ocorreu há pouco mais de cem anos.
História
Dois personagens são chave na história da esquizofrenia: o alemão Emil Kraepelin e o suíço Eugen Bleuler.
Devido os sintomas da doença frequentemente produzirem incapacidade severa, Kraepelin originalmente denominou-a como “demência precoce”. Alguns anos depois, Bleuler sugeriu rebatizar este distúrbio de “esquizofrenia”, que significa “mente fragmentada”. Enquanto Kraepelin enfatizou os aspectos de severidade e cronicidade, Bleuler ponderou sobre a natureza dos sintomas típicos, considerando a fragmentação na formulação e expressão do pensamento o principal sintoma.
Prevalência
Segundo o portal da Organização Mundial da Saúde (OMS), a esquizofrenia afeta cerca de 23 milhões de pessoas em todo o mundo. A prevalência mundial de 1% é frequentemente mencionada na maioria dos estudos epidemiológicos. O transtorno em geral se manifesta no final da adolescência e início da idade adulta (raramente antes dos 16 anos ou depois dos 50 anos). Pode ter um início agudo, ao longo de 2 a 3 semanas, ou insidioso. A maioria dos indivíduos, antes da primeira crise, experimenta um período, onde alguns sintomas estão presentes, mas não preenchem todos os critérios do transtorno (fase prodrômica).
Causas
A etiologia da esquizofrenia é desconhecida. Trata-se, muito provavelmente, de um transtorno heterogêneo, de origem genética e ambiental. O componente ambiental pode ser biológico (infecções, problemas na gestação ou parto) ou psicológico (traumas, situação familiar estressante, morte de um parente próximo).
Quadro Clínico
A esquizofrenia é uma doença mental caracterizada por sintomas positivos, negativos e cognitivos que afetam quase todos os aspectos da atividade mental, incluindo a percepção, a atenção, a memória e a emoção. Os sintomas estão associados a diversos graus de prejuízos sociais e funcionais persistentes.
Sintomas positivos
Os sintomas positivos da esquizofrenia são as distorções das funções normais de pensamento, emoções ou comportamento. São de reconhecimento mais simples e são o principal alvo dos tratamentos com os antipsicóticos.
São o que chamamos delírios, alucinações e comportamentos bizarros.
Delírios
Os delírios são crenças falsas a respeito das quais o indivíduo está firmemente convencido. Às vezes esses delírios são muito sistematizados e complexos. Entre os tipos de delírios temos:
- Delírios de perseguição: os indivíduos acreditam que são vítimas de conspirações ou que estão sendo intencionalmente prejudicados ou ameaçados.
- Delírios de referência: atribuem um significado pessoal às ações, declarações de outras pessoas quando na verdade não existe tal significado; por exemplo, quando o indivíduo tem a crença que o programa de televisão está se referindo a ele especificamente.
- Delírios de controle: surgem com a crença de uma força externa ou de um agente que está controlando seu pensamento ou seu corpo. Podem acreditar que algum pensamento tenha sido inserido na sua mente. Pode haver a crença de que seu pensamento seja roubado ou transmitido aos outros.
- Delírios de pecado ou culpa: geralmente com a crença de que um pequeno erro no passado pode levar a uma catástrofe.
- Delírios de grandeza: onde os indivíduos acreditam ter poderes extraordinários, riqueza ou fama.
- Delírios místicos: onde os indivíduos podem acreditar ser novos profetas.
Alucinações
As alucinações são percepções sensoriais na ausência de estímulos. As alucinações auditivas são o tipo mais comum e geralmente consistem em vozes que costumam comentar sobre as atividades do indivíduo; às vezes podem ser ameaçadoras, acusatórias ou ordenam alguma ação. Alguns indivíduos relatam ouvir vozes “boas” e “más”. Alucinações auditivas são relatadas por 50 a 70% dos pacientes com esquizofrenia. Em outros casos, indivíduos com alucinações visuais observam pessoas, vultos de pessoas, formas, cores e objetos que não estão fisicamente presentes. Mais raramente os indivíduos podem apresentar alucinações táteis ou somáticas e alucinações olfativas.
As alucinações tendem a estar relacionadas com os delírios do paciente, por exemplo, no contexto de um delírio místico seriam observadas visões de figuras místicas.
Comportamento bizarro
Ainda nos sintomas positivos, alguns indivíduos apresentam comportamento bizarro, ou seja, comportam-se de forma estranha. Por exemplo, podem falar sozinhos, fazer caretas, rir sozinhos sem explicação. Podem vestir-se de maneira incomum, excêntrica ou desleixada ou usar muita roupa num dia de muito calor.
O comportamento motor bizarro pode envolver movimentos de balanço, caretas ou maneirismos incomuns. Em quadros mais graves, o comportamento motor catatônico pode incluir uma postura rígida ou não natural, petrificada e desorganizada.
Sintomas negativos
Os sintomas negativos são uma característica frequente e persistente da doença. Podem fazer parte da fase prodrômica, precedendo os sintomas psicóticos (positivos) e costumam persistir entre as crises.
Entre os sintomas negativos, o afeto embotado ou hipomodulado caracteriza-se por diminuição da reação emocional aos estímulos, com redução dos movimentos espontâneos ou de gestos de expressão, marcando no indivíduo um tom monótono. O contato interpessoal tende a ser pobre, levando o paciente a um retraimento social cada vez maior. Avolição (falta de vontade) e apatia surgem como falta de energia ou interesse para iniciar atividades. Assim o indivíduo apresenta dificuldades em manter um emprego ou atividades escolares e ainda perde o interesse em arrumar-se ou cuidar da própria higiene.
Sintomas Cognitivos
O transtorno do pensamento é um sintoma cognitivo constante na esquizofrenia e considerado por Bleuler uma característica fundamental da doença.
Entre os tipos de transtornos do pensamento encontramos a desagregação do pensamento, a tangencialidade, a incoerência, o ilogismo, os neologismos, a dificuldade de pensamento abstrato, a ecolalia e bloqueio do pensamento.
Outros sintomas
Ainda podem se manifestar sintomas de ansiedade, depressão, auto-mutilação, suicídio e sintomas de excitação como hostilidade e agressividade.
Diagnóstico
Apesar de bastante estudada, a esquizofrenia segue apresentando muitas dificuldades para o seu completo entendimento. Isto costuma acarretar um atraso de alguns anos para seu diagnóstico desde o surgimento dos primeiros sintomas. Portanto, a melhor atitude é ficar atentos às mudanças de comportamento dos jovens e não hesitar em buscar avaliação especializada, visto que quanto mais cedo se estabelece o tratamento, mais efetivo e melhor o prognóstico.
Tratamento
Os remédios controlam os sintomas positivos da esquizofrenia há cerca de 50 anos. No entanto, estes fármacos costumam causar muitos efeitos colaterais, lembrando os sintomas da doença de Parkinson.
As medicações mais recentes, conhecidas genericamente como antipsicóticos de segunda geração, provocam menos eventos adversos graves e conseguem melhorar também os sintomas negativos da doença. Por essa razão, o ideal é dar preferência a essas opções mais novas durante as primeiras tentativas.
Uma excelente opção de farmacoterapia, visto que uma grande dificuldade é a adesão ao tratamento, é a utilização de medicações injetáveis de longa ação. Atualmente temos no mercado formulações de injeções de quinze, trinta e noventa dias. A este tratamento injetável de longa ação estão associados os melhores índices de resposta terapêutica, do menor número de internações, prevenção de novas crises psicóticas e menores prejuízos que a doença provoca na vida do paciente.
O contato com o terapeuta ou equipe multidisciplinar também é essencial no controle e recuperação da esquizofrenia.
Entender as emoções, ponderar os pensamentos e identificar os gatilhos que podem desencadear surtos é fundamental, assim como orientar ajustes no estilo de vida, como alimentação e prática de atividades físicas.
Ainda, evitar o uso de drogas como álcool e maconha, muito conhecidos como disparadores de crises.
Estigma
A esquizofrenia e a forma como ela se manifesta são desconhecidas para a maioria das pessoas. O estigma está relacionado a conhecimentos insuficientes ou inadequados, que leva a preconceitos, à discriminação e ao distanciamento social da pessoa estigmatizada. Por exemplo, a ideia de que os doentes mentais são violentos é muitas vezes difundida na mídia e não encontra respaldo na realidade visto que, na maioria das vezes, os portadores são mais vítimas de violência e não seus causadores.
Assim, o estigma está associado a uma visão estereotipada e contribui com a exclusão social e que coloca os doentes em posição de desvantagem quando buscam emprego, moradia, estudo, etc.
O estigma em relação aos transtornos mentais tem grande impacto na vida dos portadores e por isso vem sendo mais estudado e tornou-se uma preocupação das autoridades em saúde.